Caçadora de Cadáveres...

Não sei porque cargas d'água, mas acho que foi por causa da notícia de que o Oscar de Melo vai engrossar o time da TV Pajuçara na área policial, eu comecei a lembrar do período em que fui repórter desta área, primeiro na TV Alagoas, e depois na TV Pajuçara.

Eu estava muito bem na TV Alagoas, cobrindo política, todos os dias acompanhando a agenda do Governo Ronaldo Lessa, quando, em 2003,  a TV Pajuçara contratou os dois principais nomes do programa policial da TV Alagoas, Jefferson Morais e Cristiano Matheus, para fazer um novo programa.

Fui chamada na sala do diretor de jornalismo, que perguntou a mim e a outro colega, que até então fazia comerciais, se nós toparíamos "segurar a onda" do Plantão até eles fazerem novas contratações. Eu não tinha muita simpatia pela exposição de cadáveres que se fazia abertamente naquele período (agora as cenas fortes estão proibidas, ainda bem), mas pensei na nova experiência e no desafio, e também não tive muita escolha senão topar.
Que correria louca virou minha vida naquele período! Eu cheguei a dar plantão de doze horas seguidas, sem descanso, para não perder nenhum crime. O cinegrafista Wellington Faíska deve lembrar desse e de outros dias em que a gente não conseguia parar. Uma morte atrás da outra.

Teve final de semana que eu vi tantos cadáveres resultantes de mortes violentas, que o cérebro teve mesmo que assimilar. A gente se acostuma com o drama, o cheiro insuportável, as situações inexplicáveis... com tudo. Quem trabalha em IML e atendimento de emergência sabe bem como controlar as emoções para não se impressionar com "cenas chocantes".

Tem mesmo que se adaptar com a "rotina". Jannison Umbelino, que me orientou na primeira matéria policial, deve lembrar que eu quase passei mal quando vi um rapaz que acabava de ser liberado da delegacia de roubos e furtos, executado com um tiro em cada olho. A massa encefálica espalhada pela rua... Meses depois eu já estava ajudando a "localizar" corpos desovados em canaviais, sem me incomodar mais com cheiro e imagens.
Foi um período em que eu não comi direito, não dormi direito... aliás, já dormia vestida e maquiada, com o celular junto à orelha, para responder a qualquer chamado. Em 2004, se não me engano, a primeira ligação que recebi no primeiro dia do ano, logo depois da festa de reveillon, por volta de 3h da manhã, foi de Cição do IML avisando que estava indo recolher o corpo de uma vítima de assassinato.

Nessa época, acompanhei diariamente o trabalho dos policiais, dos peritos criminais e dos funcionários do IML, que se desdobram para compensar os efetivos pequenos e dar conta de tantas ocorrências. Também foi o tempo em que mais subi e desci grotas, percorri delegacias e acompanhei os dramas diários da população mais pobre de Alagoas. Minha irmã e alguns amigos me chamavam de "caçadora de cadáveres". Eu detestava isso. Era demais para minha sensibilidade.

O Plantão de Polícia se refez com Oscar de Melo e Sikera Junior e eu acabei indo para a TV Pajuçara. Participei do Fique Alerta ainda por um tempo, com uma reformulação no formato que na minha opinião foi bastante positiva: nada de exposição de cadáveres, mais serviços, mais entretenimento, sem deixar de dar as informações da área policial. Tive até a oportunidade, em um dia de agosto, de apresentar o programa. Nossa, foi muito engraçado. O público acostumado com Jefferson Moraes e Gernan Lopes e entro eu para substituir. Mas acho que dei conta do recado...

Passei do Fique Alerta para o telejornal da emissora, mais ou menos depois que Ernesto nasceu. Com um filho pequeno ficou mais dificil sair nas madrugadas para acompanhar as ocorrências do mundo do crime. Lembro que uma das últimas matérias que fiz, foi numa rebelião no São Leonardo, em 2005, quando já estava com seis meses de gravidez, e o comandante do Bope não gostou nada de me ver ali naquela situação. Mandou eu ficar atrás do batalhão e eu obedeci. Claro.

Hoje, eu adoro assistir "Festa Surpresa" e outras cenas divertidas no Fique Alerta. Também tem mais interação entre os programas Fique Alerta e Jornal da Pajuçara. Temos as nossas divergências "ideológicas", e dialogamos sobre isso. Não é mais um programa que assusta e nem é preciso tirar as crianças da sala...

O programa melhorou, mas o mundo do crime está pior. Cada dia mais violento e assustador. O tráfico de drogas avançando e fazendo vítimas cada vez mais jovens. O crack ao alcance fácil de qualquer usuário, enlouquecendo viciados e os familiares deles. Uma realidade que não pode ser mesmo ignorada.

Eu também espero que deixemos de "caçar cadáveres". Estamos mesmo procurando por Justiça.

Comentários

  1. A pior parte deve ser acostumar a ver cenas horríveis. Acredito (e torço para) que programas policias deixem cada vez mais de ser 'policiais' e se tornem mais serviço e utilidade pública. Para o bem de todos. Inclusive dos repórteres.

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