Enquanto isso, os barcos descansam em aguas tranquilas...

Quando esteve em Maceió, em julho do ano passado, para a inauguração da reurbanização da orla da cidade, o presidente Lula fez uma sobrevôo de helicóptero e, com seus olhos sensíveis para a realidade social, enxergou, em meio à beleza da praia e às ciclovias reformadas, um amontoado de casebres no bairro do Jaraguá, perto do porto.

Durante a solenidade, no palanque, ele olhou para o prefeito Cícero Almeida e disparou: "não é possível recuperar a orla e deixar duas ilhas de miséria”. O prefeito ainda argumentou que tem projetos para a área, mas a verdade é que essa situação se arrasta há anos e já virou uma quebra-de-braço que divide a comunidade e as autoridades públicas.

Em 2004, a União cedeu a área de marinha onde está a vila dos pescadores para que a prefeitura executasse projetos de reurbanização. Várias maquetes foram apresentadas, com casinhas bonitas, saneamento e uma balança de peixe com refrigeração. Em 2008, como nada saiu do papel, a União revogou a concessão.

Na Vila, o que se vê ainda é muito esgoto à céu aberto, moscas, lixo por todo lado e meninos amarelos, contaminados pelas doenças que proliferam no local. A prefeitura apresentou um projeto, mas não naquele lugar. A construção das 450 moradias está sendo feita na praia do Sobral, onde, todo mundo sabe, as ondas são para os surfistas e não para os barcos dos pescadores, que preferem enseadas mais sossegadas.

Mas os pescadores ainda tem esperança de tudo melhorar. O Ministério Público Federal recomendou à União que não estabeleça novo contrato de concessão com a Prefeitura de Maceió. O procurador da República, Rodrigo Tenório, apresentou dois motivos para a negativa: a maioria dos pescadores não quer ser removida do local que a comunidade ocupa há cerca de 80 anos e os projetos da prefeitura indicam investimentos com fins lucrativos, como uma marina e estabelecimentos comerciais, por isso a concessão não pode ser gratuita, já que não tem finalidade pública.

Com essa tomada de ar, os líderes comunitários prometem resistir. Claro que eles não querem continuar em barracos expostos ao esgoto e à sujeira, mas acreditam que aquelas casinhas bonitas desenhadas em maquetes virtuais podem ser erguidas bem ali, onde eles estão. Lucia Oliveira é uma das mais entusiasmadas defensoras. "Meu comprovante de residência é a minha certidão de nascimento", disse ela. "Eu nasci e me criei aqui", concluiu orgulhosa e determinada a não sair.

Enquanto os homens decidem o destino da Vila, os barcos de pesca ficam ali na enseada, balançado suavemente, sob os reflexos do por-do-sol. A paisagem é tão bonita, que quase dá para esquecer a miséria e o mau cheiro...

"Enquanto os homens exercem
Seus podres poderes
Morrer e matar de fome
De raiva e de sede
São tantas vezes gestos naturais..."

fotos: 1) Lula em Maceió - Vanessa Alencar 2) Vila dos Pescadores - Wanessa Oliveira 3) barcos de pescadores - google

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Emancipação de Alagoas: a separação de Pernambuco a construção de uma identidade alagoana

Comenda Jarede Viana

Marielle presente!